Storytelling ou storydoing? Como recuperar a confiança do cidadão

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11 dez 2019

Nos tempos de fake news e deepfakes, de bots e da repetição de mentiras até que se tornem realidade usando big data para dizer às pessoas o que elas querem ouvir, por que colocamos os fatos antes das palavras?

Na raiz da Revolução Digital, os profissionais da comunicação e marketing  começaram a concentrar seus esforços no storydoing das organizações, deixando o storytelling em segundo plano. Mas, os fatos são mais poderosos do que palavras ou a percepção significa realidade? O relevante é botar o ovo ou cacarejar, como é dito coloquialmente no México?

Se assistirmos o documentário “Nada é privado” (“The great hack”) na Netflix, a primeira conclusão pode ser que vivemos na era da manipulação através dos dados. Parece que a tecnologia veio para alimentar as teorias da conspiração que defendem que o mundo está sendo guiado à ditadura dos insights do big data e a serviço dos grandes poderes estabelecidos.

Em 2018, a famosa revista Science publicou um estudo de três especialistas do MIT, Sinan Aral, Soroush Vosoughi e Deb Roy. Uma de suas primeiras conclusões é que as mentiras chegam muito mais longe, mais rápido, mais profundamente e mais amplamente que o conteúdo verdadeiro.“As fake news têm 70% mais chance de serem replicadas”, disseram os autores do estudo.

De acordo com o mesmo estudo, o problema está nas pessoas, que enfrentam os sentimentos de raiva, surpresa e nojo gerados pelas mentiras, e que têm maior probabilidade de compartilhá-las acima de verdades, que geram tristeza, antecipação ou confiança, emoções que não nos movem da mesma maneira e nos levam a ser mais passivos em termos de amplificação e interação.

“Transparência, autenticidade e comunicação através dos fatos são a receita para acabar com essa situação e recuperar a confiança”

Acreditamos em mentiras?

Um outro estudo do Pew Research Center, de julho de 2019, destaca a crescente desconfiança dos norte-americanos nas instituições e entre as pessoas, o que poderia dificultar a solução de problemas sociais e políticos. Esse fenômeno não ocorre apenas nos EUA. Segundo o Estudo “Perspectivas Econômicas na América Latina de 2019”, da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), cerca de 64% da população dessa região do mundo não confia em seus governos nacionais.

Somos então confrontados com uma dicotomia, o auge das falsidades digitais, mas que não estão realmente gerando credibilidade, pelo contrário, estão gerando um estado permanente de ceticismo e, em casos extremos como o do terremoto, até ações dissidentes dos cidadãos.

Parece que transparência, autenticidade e comunicação através dos fatos são a receita para acabar com essa situação e recuperar a confiança. No entanto, não devemos esquecer que vivemos em um contexto de intoxicação no qual o storydoing não é suficiente, porque uma boa ação que não é contada da maneira correta, que não é “carcarejada”, não chamará a atenção de nossas mentes, que vivem absorvidas em um mar de conteúdo e buscam emoções.

“Storytelling e storydoing não competem em relevância e efeito, mas andam de mãos dadas e se retroalimentam”

Razão vs. Emoção

A Revolução Digital não acabou, pelo contrário, está apenas despontando. Há apenas 10 anos que smartphones e as redes sociais começaram a se democratizar e a tecnologia continua a transformar todos os dias pensamentos e hábitos de vida a uma velocidade vertiginosa. Certamente, a regulamentação e a autorregulação das próprias plataformas digitais, com o apoio das próprias tecnologias, ajudam uma transformação em que uma maior transparência cria confiança novamente. Mas a comunicação também tem um grande peso nessa equação, não apenas no campo racional, mas também no emocional, que guia em grande parte o comportamento humano.

As pessoas se movem por sentimentos, pelas expectativas geradas a partir de um conhecimento ou de uma experiência, e quando se conectam com esse plano, a confiança é realmente gerada. O prestigiado neurologista Antonio Damasio garante que, em um mundo acelerado em que nos movemos com pressa, dificilmente há tempo para refletir e, portanto, é a heurística da afetividade que leva a decisões baseadas no humor: “O que diferencia os humanos dos animais é que usamos processos fundamentais de regulação da vida, que incluem coisas como emoções e sentimentos, mas os conectamos aos processos intelectuais de forma a criar um novo mundo ao nosso redor”.

Esse juiz implacável, que é o tempo, está sentenciando e mostrando que storytelling e storydoing não competem em relevância e efeito, mas andam de mãos dadas e se retroalimentam; não deve haver ovo que se bote sem carcarejar e vice-versa; se você quiser ter sucesso em uma estratégia de comunicação, precisará trabalhar em ambas as frentes; na verdade, a ação deve estar focada em atender às expectativas dos grupos de interesse, mas também na história, no relato emocional e experiencial que se conecte através do sentimento, para recuperar a confiança e fazer as pessoas acreditarem novamente. As instituições, organizações, pessoas ou marcas que a alcançam, que realmente usam big data para entender essas expectativas, sentimentos e que dão uma resposta coerente através de suas ações e fatos, são as que realmente terão sucesso e transcendem, caso contrário, estarão condenadas a serem irrelevantes e obsoletas, porque a ética e a estética são uma só.

Autores

Rogelio Blanco
Juan Arteaga

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