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Hoje em dia, cada interação parece se transformar em um campo de batalha. O panorama atual do diálogo público caminhou em direção a um cenário de confronto constante. Seja na tensão fugaz de um tuíte, na acalorada discussão de um debate na televisão ou, inclusive, na trivial, mas angustiante espera na fila para comprar pão, o conflito deixou de ser uma exceção para se transformar na regra. Nem é preciso falar sobre temas como política, religião e futebol, antes catalisadores de trocas construtivas e que hoje são detonadores de debates cada vez mais violentos e agressivos.
Essa onipresença da polarização não apenas divide opiniões, mas também radicaliza os nossos pensamentos e emoções. Empurra-nos para um estado em que a simples divergência se transforma em motivo de rejeição visceral. E como se a divisão ideológica não fosse um desafio suficiente, também enfrentamos uma polarização emocional crescente. Porque os conflitos não se manifestam apenas por meio de diferenças ideológicas, mas também são impulsionados por respostas emocionais intensas e muitas vezes extremas. Essa dimensão emocional da polarização agrega uma complexidade adicional à gestão da comunicação e das relações públicas, exigindo uma sensibilidade e uma agilidade maiores na nossa estratégia de conexão com os nossos stakeholders e mitigação do impacto dessas tensões emocionais.
Nesse sentido, o território político dos Estados Unidos está tão polarizado que inclusive existem comunidades que debatem a existência ou não de polarização no país hoje. A tal ponto que o think tank Carnegie Endowment for International Peace elaborou um paper sobre o que é possível fazer nos EUA diante desse fenômeno. “Embora os norte-americanos não estejam polarizados ideologicamente como acreditam – diz o documento -, eles o estão emocionalmente (polarização afetiva). Em outras palavras, eles não gostam dos membros do outro partido (político) (1)”. Mas deixemos de lado a política, onde é mais fácil e até esperado que ocorra esse fenômeno de divisão.
A dimensão emocional da polarização acrescenta uma complexidade adicional à gestão da comunicação. Exige uma sensibilidade e uma agilidade maiores na estratégia de conexão com os stakeholders
Quase todos os acontecimentos de grande relevância podem se transformar em um campo de batalha para ideologias em conflito. A cerimônia dos Jogos Olímpicos Paris 2024 não foi exceção, evidenciando várias dinâmicas polêmicas na comunicação social moderna. Alguns viram a cerimônia como uma vitrine de orgulho cultural e unidade internacional, enquanto outros a viram com um olhar do custo econômico, das crenças religiosas, das implicações políticas, das orientações sexuais ou de identidades de gênero, entre outros.
Nem mesmo os artistas de Hollywood têm trégua. Em agosto deste ano, a atriz Blake Lively foi tema de um artigo (2) na Vogue Espanha intitulado “Blake Lively y su crisis de reputación durante la tumultuosa gira de promoción de ‘Romper el círculo’” [“Blake Lively e sua crise de reputação durante a tumultuada turnê de promoção de ‘É assim que acaba’”]. O texto jornalístico se baseia especificamente na polarização gerada entre os fãs pelo comportamento da atriz na turnê promocional do filme. De acordo com as críticas, em vez de ser uma voz evangelizadora sobre a violência de gênero, em linha com o tema central do filme, ela se dedicou a se promover como empresária e fashionista, o que incendiou as plataformas do “X” e do TikTok entre seus próprios fãs. Com isso, podemos ver como esse fenômeno não apenas germina entre aliados e detratores, mas também pode gerar divisão entre os nossos defensores.
A polarização nos acompanha há tempos, no entanto, como vimos, a natureza interconectada das plataformas de redes sociais foi a causa do seu aguçamento, permitindo que vozes díspares, e em geral polarizadas, se unam e amplifiquem as suas mensagens.
Obviamente, as organizações e empresas não estão isentas a esse fenômeno. Na verdade, encontram-se sob um escrutínio constante por parte da sociedade. Nesse ambiente, é fundamental que as empresas se preparem para enfrentar esses desafios de maneira estratégica e cuidadosa. O objetivo: evitar se afastar de mais grupos de interesse e, ao mesmo tempo, proteger e fortalecer a reputação corporativa, que é um reflexo direto do julgamento público. É na reputação que devemos concentrar nossos esforços para proteger os capitais dos nossos negócios no contexto atual.
Temos consciência do quanto construímos em prol da nossa reputação? Como a nossa empresa se sairia caso uma situação crítica, produzida por esse tipo de risco de polarização, fosse desencadeada? O jogo tem novas regras e não podemos continuar com a gestão tradicional. As empresas precisam fazer um ajuste sobre quando e como se fazerem ouvir. Temos dois caminhos: o da resiliência e o da antifragilidade, que não deveriam ser excludentes.
As empresas devem se preparar para enfrentar estes desafios de maneira estratégica. O objetivo: evitar se afastar de mais grupos de interesse e, ao mesmo tempo, proteger e fortalecer a reputação corporativa
Em uma estratégia de resiliência devemos ser capazes de nos adaptar e recuperar diante de situações de adversidade.
- Aproveitando os momentos de calma para nos preocuparmos em estar bem equipados e preparados para identificar e analisar quando um sinal de alerta poderia ser acionado, sem perder o controle da situação, podendo reagir e nos defender oportuna e satisfatoriamente. Não apenas com um bom panorama dos riscos potenciais, mas também com planos de ação que ajudem a mitigá-los.
- Participando de uma escuta ativa para compreender as diversas perspectivas dos stakeholders. Ao coletar esses comentários com diversas opiniões, as empresas podem antecipar melhor os problemas potenciais e abordar as inquietações de maneira proativa.
No que diz respeito a uma estratégia de antifragilidade, temos que ser capazes de prosperar e crescer em contextos de volatilidade para não ficarmos congelados diante de uma chuva de riscos que caem como peças de Tetris.
- Conduzindo a comunicação das nossas empresas, porque o pior que pode nos acontecer é ter que enfrentar um risco e não ter um colchão reputacional que, pelo menos, nos dê o benefício da dúvida.
- Investindo em iniciativas que deem valor ao propósito da empresa e priorizando-as em relação a iniciativas com benefícios de curto prazo.
- Utilizando o pensamento sistêmico Marca/ Reputação para nos assegurarmos de identificar oportunidades que nos permitam desenvolver um storytelling de acordo com a nossa promessa de valor, nos baseando nos pilares da marca (Personalidade, Promessa, Cultura e Propósito) e nos drivers reputacionais (Personalidade, Promessa, Cultura, Propósito e Contribuição)
O verdadeiro desafio para sermos valorizados pelos nossos stakeholders está em construir uma reputação sustentada em um modelo de gestão que seja responsável e sustentável em sua essência
Em última análise, o verdadeiro desafio para obter uma avaliação positiva por parte dos nossos stakeholders está em construir uma reputação sustentada em um modelo de gestão que seja responsável e sustentável em sua essência. Esse modelo deve se integrar profundamente às expectativas dos nossos grupos de interesse, refletindo as suas preocupações em cada decisão tomada. As empresas que conseguirem harmonizar de maneira efetiva os seus valores corporativos com as demandas dos seus públicos não apenas sobreviverão, mas vão prosperar nesse ambiente cada vez mais polarizado. Em um contexto em que a divisão e o conflito se intensificam, aquelas organizações que demonstrarem adaptabilidade e uma estratégia alinhada serão as únicas capazes de navegar com êxito nesses tempos turbulentos.
(1) Polarization, Democracy, and Political Violence in the United States: What the Research Says
(2) Blake Lively y su crisis de reputación durante la tumultuosa gira de promoción de ‘Romper el círculo’
Lidera e promove as estratégias de comunicação corporativa e gestão de crise na LLYC Peru, tanto interna como externamente. Com mais de uma década de experiência em gestão de reputação, comunicação e consultoria de crise, trabalhou na Superintendência do Mercado de Valores do Peru e em uma importante empresa de auditoria. Sua trajetória na LLYC começou em 2011, como Consultora, e foi promovida a cargos importantes como o de Coordenadora de Relações Públicas e Gerente da área de Crises e Litígios. Formada em Comunicação, tem um mestrado em Prática de Meios pela Universidade de Sydney, Austrália. Sua experiência engloba a criação e a gestão de estratégias de comunicação em diversos setores, fortalecendo a reputação de organizações e oferecendo soluções para os desafios do mercado peruano. [Peru]