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Foram os ativistas sul-africanos pelos direitos dos incapacitados que fundiram na expressão “Nothing about us without us” o princípio que promove toda a campanha de grassroots: o direito de as comunidades se unirem e influenciarem assuntos que afetem o seu dia a dia.
Aparentemente tão fáceis de explicar, como seria mencionar o antigo provérbio de “A união faz a força” e tão complexos de antecipar, organizar, analisar e quantificar, os grassroots estão tendo um protagonismo crescente nos últimos anos, captando uma atenção política e midiática que, habitualmente, consistia em uma parcela de ações tradicionais de influência. Conhecedoras do seu potencial, empresas como a UBER combinaram ações tradicionais de comunicação, publicidade ou lobby com a força coletiva dos seus usuários. Durante 2016, ao mesmo tempo em que se solicitava um veículo em Nova York, era possível enviar um pedido diretamente ao prefeito para a regulação dos seus serviços, o que viria a ser denominado de “de Blasio’s Uber”.
Os organizadores das campanhas de grassroots criam as condições adequadas para que os cidadãos interessados em defender um projeto tenham as mesmas ferramentas para se encontrarem, unirem, organizarem e influenciarem a tomada de decisões. São uma prática frequentemente utilizada no ambiente anglo-saxão e que se encontra em crescimento ao nosso redor através de campanhas políticas ou de ONG. Portanto, é conveniente conhecer de que forma se articulam para que fiquem sabendo em que momento uma campanha de grassroots pode jogar a nosso favor e dar visibilidade à licença social dos nossos projetos.
Como inspirar a ação
Apesar de os momentos sociais não serem uma novidade, a teoria que acompanha as campanhas de grassroots nasce, tal como tantas outras práticas associadas à gestão da influência, pela mão de dois pesquisadores da Universidade de Harvard, Marshall Ganz e Ruth Wageman. Eles observaram a forma de os programas de voluntariado se organizarem hierarquicamente e por objetivos individuais. Não existia margem para a interação, para a iniciativa nem para a liderança e, como consequência deste processo solitário e pouco motivador, os voluntários abandonavam a organização, frustrados por não terem vivido grandes sucessos e sem terem se sentido parte do projeto. O modelo desenvolvido por Ganz e Wageman propõe que os membros das equipes criem relações, assumam parcelas próprias de liderança, que vivam experiências alheias e as aproveitem como agente motivador e impulsionador da mudança.
“Trata-se de inspirar até que a ação seja produzida”
A campanha de Obama de 2008 experimentou, pela primeira vez, o sistema Ganz-Wageman durante as primárias em Iowa e na Carolina do Sul, organizando, capacitando e mobilizando as suas bases em objetivos compartilhados. Ele venceu em ambas. Por outro lado, em New Hampshire, onde dirigiu uma campanha de marketing mais tradicional, acabaria por perder.
Durante o seu segundo mandato, ele recorreu à Organizing for Action como ferramenta para impulsionar campanhas de Grassroots que reforçaram as suas prioridades legislativas:
Se ligarmos as fases de uma campanha de grassroots na sequência da motivação de comunidades, verificamos que o objetivo de uma campanha é fazer transitar os cidadãos da ignorância e desorganização para a satisfação que produz a celebração de uma vitória por menor que ela seja. Trata-se de inspirar até que a ação seja produzida.
AS FASES DE UMA CAMPANHA DE GRASSROOTS
PLANEJAMENTO
Nesta fase, as comunidades estão desorganizadas, desunidas e não contam com ferramentas para a ativação.
É a forma através da qual se explica uma campanha ao público e de que forma se planeja vencê-la, ligando o público ao processo. Por isso, é necessário um conhecimento profundo das comunidades para entender as suas motivações.
CAPTAÇÃO
É nesta fase que o nosso projeto chega até a comunidade e começa a gerar interesse através de mensagens com uma forte vertente emocional e com atividades que motivem a interação entre as comunidades.
ORGANIZAÇÃO
Nesta fase, torna-se visível o início da organização de uma comunidade desorganizada. É essencial uma comunicação frequente com a comunidade, conhecer as suas opiniões e comentários, ouvir as suas respostas e atuar sobre as mesmas. São estabelecidos sistemas de trabalho por equipes, são disponibilizadas oportunidades de treinamento e é conceituado o trabalho como o desenvolvimento de uma comunidade, mais do que como uma lista tradicional de associados ou voluntários.
ACTIVAÇÃO
É nesta fase, em que se passa à ação, que as comunidades têm ferramentas e treinamento, conhecem os objetivos e podem trabalhar com autonomia e liderança.
CELEBRAÇÃO E EVALUAÇÃO
A fase de celebração, embora seja de pequenas vitórias, é necessária, para que as comunidades se sintam integradas no projeto e se sintam satisfeitas com os resultados que as retroalimentem.
Os grassroots como ação de lobby
Cada vez existe um maior número de stakeholders políticos influenciadores e grupos de interesse ativos. Não é de estranhar que, uma vez que muitos têm acesso ao decisor, aos meios e às redes, as mensagens se diluam, se percam e se esqueçam. Consequentemente, a mobilização de terceiros é uma prática habitual nas ações de lobby, para dotar o projeto de maior representatividade e legitimidade, dando mais importância a determinados issues na agenda política e midiática.
Tradicionalmente, a construção de alianças tem sido desenvolvida em forma de associação setorial e sido integrada por membros corporativos ou institucionais que não registaram mobilização de bases ou, caso ela tenha existido, ocorreu sob um sistema de comunicação unidirecional onde se trabalha com grupos estanques e hierarquizados.
As campanhas de grassroots também são uma forma de mobilização de terceiros, embora baseadas em um modelo organizacional aberto, em que as bases assumem parcelas próprias de autonomia, a informação é compartilhada e o controle absoluto é renunciado, em troca de colaboração.
“O objetivo de uma campanha de grassroots deve ser conciso, claro, compartilhado com todos os membros e mensurável em longo prazo”
Joan Navarro é sócio e vice-presidente da Área de Relações Públicas da LLORENTE & CUENCA. Licenciado em Sociologia pela UNED e PDG do IESE-Universidade de Navarra. Perito em comunicação política e relações públicas, de 2004 a 2007 foi diretor do Gabinete do Ministro da Administração Pública e, em 2010, foi reconhecido como uma das 100 pessoas mais influentes pela revista El País Semanal. Fundador do fórum +Democracia, entidade que promove mudanças institucionais para a melhoria do funcionamento democrático. Desenvolve atividade docente em diversos centros universitários, é membro da comissão espanhola da Strategic and Competitive Intelligence Professional (SCIP) e colaborador do diário El País.
Laura Martínez é consultora sênior da área de Relações Públicas da de LLORENTE & CUENCA. Licenciada em Publicidade e Relações Públicas pela Universidad de Valladolid e com um mestrado em Gestão de Comunicação Institucional e Opinião Pública pela URJC. Ela ingressou na de LLORENTE&CUENCA em 2010 e, desde então, trabalhou na concepção e implementação de programas de relações institucionais e gestão da influência para clientes como Asociación de Empresas Tabacaleras, UTECA, Cellnex Telecom ou Coca-Cola, bem como projetos de reputação corporativa para a UBS ou a Heineken España. Também trabalhou com multinacionais do setor individual como a Discovery Communications e a Bertelsmann.