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PaísesPortugal
As eleições autárquicas de 12 de outubro de 2025 redesenharam o mapa político local em Portugal. Num cenário marcado por elevada fragmentação e crescente competição territorial, o PSD, o maior partido da coligação que apoia o Governo, emergiu como o partido mais votado, conquistando 136 câmaras municipais.
Este resultado é ainda mais relevante porque os social-democratas não só asseguraram a presidência da Associação Nacional de Municípios Portugueses, que era do PS há 12 anos, como também o fizeram ganhando nos principais municípios do país: Lisboa, Porto, Sintra, Vila Nova de Gaia, Braga ou Cascais.
A incerteza sobre quem se poderia considerar vencedor prolongou-se até bem tarde na noite deste domingo. As projeções à boca da urna davam empates nos principais municípios, prometiam disputa até ao fim e abriam a possibilidade de o PS conquistar um dos principais municípios do país, Lisboa ou Porto.
Mas à medida que as horas passaram, tornou-se claro que apenas Luís Montenegro, reeleito primeiro-ministro há apenas cinco meses, poderia reclamar o título de vencedor, como aliás o próprio admitiu. Este é um resultado que reforça o seu Governo e mostra que os social-democratas são neste momento o principal partido a nível nacional.
O PS, que desde 2021 liderava 149 autarquias, sofreu uma quebra significativa, ficando com apenas 127 câmaras. A distância face ao PSD não é grande, apenas nove municípios, porém o PS falhou quase todos os principais objetivos: deixou de ser o maior partido no poder local e perdeu Lisboa e Porto. Algumas vitórias inesperadas, como Coimbra ou Viseu, não apagam uma performance abaixo do esperado.
No entanto, os socialistas conseguiram inverter a má imagem deixada nas legislativas de maio, voltaram a merecer a confiança dos portugueses em muitos municípios e por isso o seu líder, José Luís Carneiro, tinha motivos para sorrir. O PS cai mas resiste e mostra que continua a ser uma força com relevo no país.
PSD E PS AINDA SÃO QUEM MAIS ORDENA
Os resultados confirmam que o bipartidarismo entre PSD e PS continua a estruturar o poder local, com ambos os partidos a repartirem mais de 80% das presidências de câmara. A disputa até à última entre os dois reforça a centralidade destas forças na governação autárquica, mesmo num contexto de maior fragmentação.
O Chega, que teve um resultado estrondoso nas eleições legislativas de maio, ficou atrás da CDU e do CDS em número de câmaras – somou apenas três. Este resultado deixa o partido numa posição ambígua: ganhou pela primeira vez câmaras, voltou a crescer de forma significativa face às últimas autárquicas, mas ficou muito longe do resultado que esperava ter.
É uma das principais conclusões da noite: o PSD e o PS continuam a ser os partidos mais relevantes a nível local e o Chega, que nos últimos anos tem crescido de forma evidente e sucessiva a nível eleitoral, obteve desta vez um resultado humilde, abaixo das expectativas, que mostra que também pode ser travado nas urnas.
O CDS, parceiro júnior da coligação do Governo, conseguiu manter o controlo das seis câmaras que conquistou em 2021, confirmando a sua importância como partido autárquico e somando a presidência de uma câmara, a da Mêda, que, embora em coligação com o PSD, teve o Presidente a ser indicado pelos centristas.
Por outro lado, os candidatos independentes voltaram a crescer no número de câmaras municipais conquistadas pela quinta eleição consecutiva. 20 autarquias passam a ser comandadas por presidentes sem qualquer ligação aos partidos tradicionais, mais uma do que em 2021. Entre estes candidatos também se encontram figuras políticas de peso, nomeadamente o popular Isaltino Morais, que conquista a Câmara de Oeiras pela 11ª vez, e desta vez com o melhor resultado de sempre: 62%.
Confirmando a tendência dos últimos atos eleitorais, a CDU, coligação que junta o Partido Comunista Português e o Partido Ecologista Os Verdes, continuou a perder terreno no poder local, ficando agora com apenas 12 câmaras, o pior resultado de sempre da coligação em eleições autárquicas. Até agora, a CDU governava 19 municípios.
A Iniciativa Liberal, apesar de ter celebrado vitórias em coligação com o PSD, enfrenta um momento difícil, com resultados modestos nas candidaturas independentes e uma sucessão de crises internas que têm comprometido o seu desempenho eleitoral.
O Bloco de Esquerda continua a ter muito pouca relevância no plano executivo autárquico, confirmando a tendência descendente dos últimos anos. Apesar de sublinhar os resultados obtidos em coligações, o partido enfrenta um momento delicado, refletido na sua atual representação parlamentar reduzida.
Embora com expressão limitada, o Livre registou vitórias pontuais, mesmo que moderadas, em coligação, como em Felgueiras, com o PS, e Coimbra, com o PS e PAN. Estes resultados, ainda que localizados, permitem ao partido reivindicar algum protagonismo nas autárquicas.
PERFORMANCE POSITIVA
Luís Montenegro
Era a primeira prova de fogo do líder do PSD depois das eleições de maio, num momento politicamente sensível, dias depois da apresentação do Orçamento do Estado para 2026. E foi superada com grande sucesso. O PSD tornou-se o principal partido no poder local e ainda somou a isso as principais câmaras municipais do país, incluindo as duas principais cidades – Lisboa (41,69%) e Porto (37,29%).
O seu partido parte agora para a discussão e negociação do OE com uma legitimidade acabada de reforçar nas urnas, e consegue ao mesmo tempo “destrunfar” o Chega, que agora perde o ascendente que tinha vindo a mostrar nos últimos meses à boleia do resultado nas legislativas.
O PSD conseguiu também roubar algumas das autarquias mais populosas do país ao PS, como Sintra, onde os social-democratas conquistaram 33,86% dos votos, e Vila Nova de Gaia, onde conseguiu 40,74% da votação. O principal partido do Governo alcançou ainda vitórias importantes em bastiões tradicionalmente socialistas, como Guimarães ou Baião, terra natal do líder socialista José Luís Carneiro, onde o PSD venceu com maioria absoluta.
Para o Primeiro-Ministro, esta vitória conduz novamente o PSD ao título de “maior partido do poder local”, reforçando a confiança que os portugueses têm depositado nos social-democratas. Montenegro sublinha que o partido foi o “que teve mais votos, que teve mais mandatos, que elegeu mais presidentes de câmara municipal e de juntas de freguesia, que obteve uma vitória histórica nos cinco maiores concelhos do país e que se apresenta em condições de liderar a Associação Nacional dos Municípios Portugueses”. Montenegro assumiu-se como “grande vencedor” das eleições, e foi-o de facto.
Nuno Melo
O CDS resistiu à erosão que foi registando a nível nacional antes de se coligar com o PSD e, sozinho, conseguiu manter as seis câmaras que já controlava. Os democratas-cristãos conseguem demonstrar que mantêm relevância política a nível local.
O resultado permitiu que o líder do partido (e Ministro da Defesa), Nuno Melo, cantasse vitória, celebrando um “ciclo de crescimento” e garantindo que o “CDS supera todos os momentos difíceis”. Para Melo, este triunfo marca mais um sucesso desde a sua eleição como líder do partido, que tem registado vitórias consecutivas sob a sua liderança.
Tal como acontece com o PSD, este resultado não representa apenas uma vitória para o partido, mas também reforça o posicionamento do Governo perante os principais partidos da oposição, como o PS e o Chega, contribuindo para o Executivo partir para as negociações do Orçamento do Estado para 2026 com legitimidade reforçada.
PERFORMANCE MISTA
André Ventura
O crescimento do Chega nas autárquicas era um dos segredos mais mal guardados da noite. O partido superou largamente os resultados obtidos nas eleições de 2021, mas isso não era difícil: o partido não liderava qualquer câmara municipal nem tinha a implantação nacional que hoje regista. No final da noite, Ventura assegurou a vitória em três câmaras municipais: São Vicente, Entroncamento e Albufeira.
Mas este é o único dado positivo para o líder do Chega. Apesar de triplicar o número de votos face ao resultado de há quatro anos, o partido não passou dos 11,9%, ficando muito longe do resultado que obteve nas eleições legislativas (22,8%) e de conseguir ganhar oito câmaras, o objetivo assumido pelo partido na campanha eleitoral.
Ventura diz que o país ganha as cores do Chega, mas nas legislativas o partido foi o mais votado em 58 municípios. E nas maiores câmaras, como Lisboa ou Porto, ficou muito longe de poder disputar a vitória. Estes resultados colocam o Chega num dececionante sexto lugar nas eleições autárquicas, o que retira a força e o impulso que o partido demonstrava depois das eleições de maio, quando subiu um degrau no pódio e se afirmou como segunda força política a nível nacional.
Estes resultados retiram peso ao Chega no debate orçamental que se avizinha e transferem para o PS algum desse ascendente político. E esse era um cenário para o qual André Ventura não estava preparado.
José Luís Carneiro
O líder do PS escolheu o ângulo que lhe é mais favorável para analisar estas eleições: comparou o resultado desta noite com o que os socialistas obtiveram nas eleições legislativas de maio (em que o PS ficou atrás do Chega em número de deputados eleitos). Embora essa leitura não conte a história toda, os socialistas parecem com este resultado conseguir inverter uma espiral que ameaçava ser negativa – e voltam a reclamar o estatuto de segunda maior força política nacional.
O PS ficou muito perto do resultado do PSD: com 127 câmaras obteve menos nove que os social-democratas, o que levou José Luís Carneiro a dizer que “o PS voltou”. O que se esqueceu de dizer foi que o partido perdeu mais de duas dezenas de municípios face a 2021. Em cima disso, o PS falhou em todas as principais câmaras: não só Porto e Lisboa escaparam para Pedro Duarte e Carlos Moedas, mas também Sintra, Gaia, Braga ou Setúbal ficaram nas mãos do principal rival.
Somando os resultados das candidaturas independentes e das coligações que integrou, a expressão eleitoral do PS ficou-se pelos 33,5% – o quarto pior resultado da história socialista em eleições autárquicas, aquém dos resultados de 2021, quando os socialistas conquistaram 37,5% dos votos.
O PS deixa de ser o maior partido do poder local e perde a Associação Nacional de Municípios, mas também tem razões para sorrir: ganhou em Coimbra, Viseu ou Bragança e conseguiu reforçar o seu estatuto de única alternativa credível aos partidos que suportam o Governo. Com a discussão do OE ao virar da esquina, não é coisa pouca o PS surgir vitaminado e com um peso que o seu líder ainda não tinha conquistado nas urnas.
PERFORMANCE NEGATIVA
Paulo Raimundo
Mostrou-se incapaz de inverter a queda eleitoral da CDU nas autárquicas, que já dura desde 2013. A CDU é uma das principais derrotadas da noite, perdendo o controlo de várias câmaras, incluindo Setúbal (um dos maiores concelhos do país) e Évora, as últimas duas capitais de distrito que restavam aos comunistas. Ao todo, a coligação elegeu 12 presidentes de câmara, menos 7 que os 19 contados nas últimas eleições.
Este é o pior resultado de sempre da história da CDU em eleições autárquicas, seguindo a tendência registada nos últimos dois momentos eleitorais locais. Até aqui, o pior resultado da coligação comunista tinha sido registado em 2021, quando não foi além dos 8,2% dos votos. Desta vez, a CDU ficou-se pelos 5,74%.
Na sede de campanha, o líder comunista, Paulo Raimundo, assumiu o “resultado negativo”. No entanto, recusou-se a atirar a toalha ao chão e celebrou a conquista de quatro novas autarquias, considerando que esse facto constitui a prova de que não há “perdas irreversíveis”.
Mariana Leitão
A noite foi de festa para a direita, mas para a Iniciativa Liberal foi só como acompanhante. O partido de Mariana Leitão faz parte das coligações que levaram a melhor em cidades como Lisboa, Porto ou Sintra. No entanto, quando analisados apenas os resultados das candidaturas independentes, a IL não foi além dos 1,6% votos, ficando bastante longe dos resultados obtidos nas eleições legislativas (5,4%).
Apesar de este até ser um valor superior ao alcançado nas últimas eleições autárquicas, quando a IL não foi além dos 1,30%, o resultado parco reforça o mau momento que os liberais estão a viver, com dificuldades na liderança e com resultados que têm ficado aquém das expectativas do partido nos últimos momentos eleitorais.
Mariana Mortágua
Confirma-se a tendência negativa que tem marcado os desempenhos eleitorais do partido mais recentes. Sem contar com as várias coligações em que o partido esteve integrado, o BE não passou dos 0,6%, muito longe dos tempos áureos do partido, em que chegou a ultrapassar os 3% (nomeadamente em 2017 e 2009).
Por esse mesmo motivo, a líder do BE, Mariana Mortágua, prefere olhar “com interesse” os resultados conseguidos através das várias coligações. Ainda assim, essa é uma leitura que pode reforçar também o mau momento que o partido está a passar, que este ano se viu reduzido a um deputado único na Assembleia da República.
COMPARATIVO DOS RESULTADOS AUTÁRQUICOS: 2025 VS 2021
RESULTADOS EM 2025