
Vivemos numa «sociedade informatizada» e as instituições e as corporações estão submetidas a «hipertransparência». No entanto, gerir as fronteiras entre a privacidade e a publicidade da informação empresarial, neste contexto de transformação digital, está a tornar-se uma questão pendente para a maior parte das empresas. «A transparência corporativa já não chega», tal como se tem vindo a pensar até agora. É isto que afirma a investigadora Elisa Baraibar na sua tese sobre este assunto.
Transparência radical
Baraibar vai buscar o conceito de «transparência radical» para definir um modelo de gestão da transparência que implica a «capacidade da alta direção da empresa para usar tecnologias baseadas na Internet (…) visando criar um diálogo direto e contínuo com os clientes e outros stakeholders».
As diretrizes de conduta e de convicções partilhadas que formam esta cultura de «transparência radical». Estas diretrizes e convicções, em vários aspetos, vão de encontro às da transparência convencional, que são as seguintes:
Relativamente ao recetor O recetor da informação é o grande esquecido da transparência convencional, que ignora a convicção fundamental sobre a apropriação por parte do indivíduo na qual é fundada a transformação digital.
A cultura de transparência radical, pelo contrário, assume o princípio de que são os clientes, os funcionários, os fornecedores, os acionistas e os cidadãos os principais intervenientes da comunicação corporativa.
Relativamente ao canal É muito complicado descobrir estudos científicos e literatura científica que certifiquem os meios sociais da Internet como canais legítimos de transparência corporativa. No entanto, os meios sociais da Internet caracterizam a prática quotidiana da transparência radical.
Relativamente à mensagem As diretrizes relativas à divulgação de informação empresarial, são também difusas em documentos e referências para a conceção clássica da transparência. Neste sentido, é de interesse a seguinte classificação destas mensagens.
- Relativamente ao volume de informação, a tendência aponta para dar prioridade à qualidade antes da quantidade. Do porto de vista da tranparência radical, o papel dos algoritmos dos motores de busca e das redes sociais é muito importante para a administração da quantidade e da qualidade da informação empresaria.
- Relativamente à materialidade da informação, a transparência herda as normas da contabilidade, especialmente os requisitos de exatidão e fiabilidade dos dados. Neste ponto, toda a preocupação da tranparência radical hoje em dia se centra em assegurar a verificação das mensagens empresariais frente as fake news.
- Relativamente ao aspeto temporal da informação, sublinha-se a periodicidade ou regularidade da publicação dos relatórios, para serem úteis. Na tranparência radical o desafio de gestão vai além da periodicidade para dar resposta à exigência contínua de informação e de interação por parte dos grupos de interesse.
- Relativamente ao envolvimento dos recetores, o debate centra-se na acessibilidade da informação para os diferentes grupos de interesse. A transparência radical entende que as mensagens alcançam o objetivo não só quando o recetor acede às mesmas, mas também quando interage com elas.
Relativamente ao emissor Na conceção tradicional, esta responsabilidade é atribuída por uma autoridade política a uma entidade empresarial.Na visão radical da transparência, esta responsabilidade é atribuída às empresas pelos seus diferentes grupos de interesse.
Concluindo, para ser considerada «transparente», uma empresa deve, por um lado, assimilar duas convicções fundamentais.
- As expetativas dos stakeholders da empresa são o ponto de referência constante durante todo o processo de comunicação que constitui a transparência.
- A empresa assume a responsabilidade de «prestar contas», tanto pelo seu desempenho ou impacto económico quanto pelo social e ambiental.
Além disso, no contexto atual de transformação digital, uma empresa «transparente» precisaria de adotar diversas diretrizes de conduta características do brand journalism, entre as quais figuram:
- Envolvimento dos dirigentes no processo de comunicação da transparência corporativa.
- Exercício de uma «disciplina de verificação» das informações relacionadas com a empresa.
Elon Musk (Tesla): «Funding secured»
Em agosto de 2018, o delegado conselheiro da Tesla, Elon Musk, publicou no perfil do Twitter dele a seguinte mensagem: «Am considering taking Tesla private at $420. Funding secured.»
O debate suscitado pelo tweet teve duas consequências. A primeira foi que, nesse mesmo dia, o valor das ações da Tesla aumentou 11 %, embora tenha logo voltado a baixar, o que permitiu avaliar a resposta do mercado perante uma possível privatização da empresa.
A segunda foi que, durante duas intensas semanas, todo o mundo financeiro se viu obrigado a pronunciar-se sobre os planos da Tesla, num sentido ou noutro. Muitos daqueles que, antes do polémico tweet, questionavam seriamente o futuro da empresa, acabaram por reafirmar a continuidade da empresa na bolsa.
Sabe-se que a decisão de tirar a Tesla da bolsa tinha sido proposta, de facto, por um dos acionistas da empresa. E que, antes do controverso tweet, o assunto tinha sido debatido pelo conselho de administração da empresa.
Também se sabe que prescindiu conscientemente dos canais formais de informação financeira da transparência convencional.
Em vez disso, Musk usou o Twitter para promover um debate aberto sobre os planos da empresa, algo que a SEC permite «tendo informado previamente os investidores sobre o uso destes canais para fazer anúncios». A Tesla estaria em conformidade com isto, uma vez que, em novembro de 2013, avisou os seus acionistas de que o feed do Twitter de Musk se tornaria uma “fonte adicional de informação”.
Autores
Jorge López Zafra