Vivemos em um constante paradoxo. À medida que a disrupção tecnológica nos impulsiona a uma corrida rumo à transformação acelerada, a humanidade também parece, mais do que nunca, agarrar-se ao solo para reivindicar a importância do que somos e de nossa relação com o meio em que vivemos. As tendências para 2019 que este relatório revelam são um reflexo dessa tensão.
Customer Experience
Diferentes marcas e empresas, especialmente aquelas focadas no segmento premium, frequentemente nos apontam que “o luxo está nos detalhes”. E que, não importa o quanto avancemos em termos de tecnologia, os fundamentos básicos do atendimento ao cliente são as chaves de toda a vida.
O relatório CISCO de “Customer Experience para 2020” revela que 70 % das decisões de compra serão baseadas na experiência do consumidor e, de acordo com o estudo VentureBeet para este mesmo ano, uma pessoa comum terá mais conversas com bots do que com seu companheiro.
A pergunta sobre como aplicar e capitalizar a tecnologia e as estratégias digitais ao marketing é simples. No entanto, embora a implementação seja complexa, as marcas que ousarem oferecer, nos próximos anos, não apenas uma experiência de compra bem sucedida, mas uma fase de pós-venda que mantenha a chama acesa, serão aquelas que terão casamentos duradouros com seus consumidores.
“Atualmente, os consumidores estão ansiosos para compartilhar suas experiências nas redes sociais e apenas marcas que são agressivas em sua forma de comunicação, que integram diferentes áreas de conhecimento às estratégias de marketing, como design, psicologia, produção de conteúdo, vendas e relações públicas, serão aquelas que manterão a preferência dos consumidores.”
Melissa Uribe, diretora de Marketing da Bacardi México
Consumidor mestiço
Estamos diante de um consumidor que reivindica fortemente a sua identidade individual através do consumo de produtos e serviços baseados em conceder originalidade. Essa tendência nasce diante da perda do sentido da individualidade, gerada, por um lado, pelos rápidos efeitos da globalização pelos quais o mundo tende a uma homogeneização social e cultural e, por outro, pela lenta permeabilização do conceito de diversidade.
Desde o design, 2019 será o ano da diversidade e do ativismo. Por exemplo, veremos mais fotografias de mulheres, raças e grupos étnicos, e crescerá o uso de retratos com posturas dóceis, mas com olhares carregados de intenção.
O consumidor mestiço compartilha abertamente seu desejo de exaltar sua própria identidade a partir da experimentação no consumo e as marcas devem encarar o desafio satisfazendo suas inquietudes identitárias.
Novos adultos
Os ultra observados millennials são os “novos adultos” e enfrentam desafios de uma perspectiva muito diferente da geração anterior. A partir de seu papel como consumidores, estes novos adultos se veem imersos em diversos modelos de consumo que afetam seu cotidiano, como o trabalho remoto ou o desenvolvimento do e-commerce.
Os novos consumidores buscam, constantemente, converter suas pressões e responsabilidades em algo mais fácil de gerir. As marcas e empresas podem servir como um recurso para “facilitar” o dia a dia dessas gerações, criando novas ferramentas, produtos, serviços, experiências e modelos de consumo. Um exemplo desse tipo de flexibilidade pode ser visto nos espaços de coworking, modelo de trabalho que vem crescendo nos últimos anos, e que permite a profissionais e empresários compartilharem o mesmo espaço de trabalho.
“Os espaços de coworking permitem algo que não ocorre em outros locais de trabalho tradicionais, como a serendipidade e a conexão com outros profissionais e empreendedores. Além de ser uma solução “chave na mão” para o trabalho, este modelo permite criar uma “comunidade”, fomentando o contínuo intercâmbio entre as pessoas, o que enriquece o trabalho, o desempenho e o bem-estar no trabalho.”
Pablo Cardozo, Gerente de Comunidade e Alianças de AreasTres Workplace
O reinado da voz
O reconhecimento de voz começou a modificar a maneira como o consumidor se relaciona com seu entorno. Ele capta a atenção de diferentes setores e faz com que mais e mais marcas incorporem essa nova maneira de interagir com os consumidores. A voz se converte não em um produto, mas em uma experiência.
A Amazon anunciou que pretende vender 113 milhões de dispositivos Echo nos próximos anos e ainda que atualmente liderem este setor, espera-se que a concorrência no mercado de dispositivos seja acirrada. A Siri, a Alexa e o Google Assistant são apenas alguns dos softwares de reconhecimento de voz mais conhecidos. No entanto, essa tendência está permeando e sendo implementada em outros momentos da vida dos consumidores, mudando sua forma de se relacionar com produtos e marcas em todos os setores.
Definitivamente, não se trata apenas de fazer com que o conteúdo existente se ajuste às considerações de um dispositivo. A tendência da voz sugere que marcas e empresas devem reconsiderar o design de seus produtos, as relações com seus parceiros e consumidores e até mesmo sua estrutura organizacional.
Rethink “social”
Atualmente, não conseguimos imaginar o nosso dia a dia sem estarmos cercados de dispositivos tecnológicos. As novas gerações estão constantemente cercadas por telas, que fornecem informações em diferentes formatos. No entanto, nossa dependência da tecnologia está se convertendo em algo alarmante, o que nos faz questionar se a culpa não é, em grande parte, das marcas.
Para acompanhar as tendências geracionais, as marcas recorrem, mais e mais, à integração da tecnologia em seus processos de compra e venda, interferindo nos modelos de socialização. Estas nos dão as ferramentas, mas também é necessário que a geração atual, e aquelas que chegam, saibam como usá-las para garantir seu bem estar físico e psicológico.
Em 2030, estima-se que 80% de todos os contatos com clientes serão feitos por meio de inteligência artificial, o que nos diz muito sobre como a tecnologia influenciará o mundo. O futuro segue em aberto e ainda temos tempo de repensar os novos moldes sociais, junto com marcas que, embora desejem um maior engagement, devem ajudar os consumidores a investirem nesta era de (des)conexões.
“O isolamento social ou o consumo massivo de tecnologia, ao contrário do contato pessoal, se veste de uma particular importância na relação entre as marcas com seus clientes. Não temos dúvidas de que o contato através de plataformas digitais é muito eficaz, mas devemos nos questionar sobre a quantidade destes contatos, e cabe às marcas retirar o público ao que se dirige de seu isolamento tecnológico e proporcionar experienciais emocionais que somente a relação pessoal consegue gerar.”
Ricardo Tomaz, Marketing Estratégico e Relações Externas de SIVA
eSports everywhere
O boom dos eSports continuará ganhando protagonismo nos próximos anos. Eles se transformaram em um mecanismo econômico e que soma audiências milionárias. Em 2020, espera-se que mais de 300 milhões de pessoas assistam a esportes eletrônicos online no mundo, gerando cerca de US$ 1,5 bilhão em receitas anuais.
Esse crescimento é uma grande oportunidade para as marcas que buscam se conectar com audiências indo além de seu alcance. Este ápice é consequência direta das mudanças nos hábitos de consumo, que, cada vez mais, optam por migrar da TV tradicional para o streaming.
Companhias de todos os portes quiseram participar do movimento dos eSports. O Facebook, por exemplo, comprou os direitos de exclusividade de quatro torneios populares. Mas a pergunta-chave é como aportar valor a este universo e inserir-se nele de uma maneira crível. As marcas devem seguir os hábitos de consumo e dar o salto fundamental em direção às plataformas de streaming, redes sociais e preparar-se para competir intensamente no mundo digital.
A guerra do streaming
O consumidor, a cada dia, é mais exigente com o conteúdo que deseja receber. Ele está disposto a fazer mudanças para obter um serviço mais personalizado e ajustado aos seus gostos, buscando qualidade antes de quantidade. As mudanças no consumo de conteúdo são determinadas pela geração on-demand (Geração Z) e afetam o modelo de negócios de diversos setores, das telecomunicações até o entretenimento.
Os talentos tradicionais de Hollywood estão buscando uma maior presença em streaming para reposicionar-se como marcas, já que as estrelas do YouTube os estão superando em termos de reconhecimento público.
A guerra pela atenção dos usuários destas plataformas provocará uma forte pressão sobre o preço e impulsionará a criação de conteúdos diferenciados e formatos inovadores. Os principais vencedores desta guerra serão os produtores de conteúdo, uma vez que os custos pela licença dos mesmos irão disparar.
“As grandes plataformas, como o Netflix, Hulu e Amazon Prime Vídeo, investem, cada vez mais, uma grande parte de seus orçamentos em conteúdos originais, obrigando a televisão paga a mudar e fazendo com que as marcas busquem integrar-se, de forma mais autêntica, orgânica e transparente.”
Julio De Los Santos, gerente de Marketing Digital e Trademarketing do Banco BHD León
Eternos novatos
Em um estudo realizado pela Ericsson, 30% dos participantes reconheceram que a velocidade com que a tecnologia se desenvolve torna impossível manter em dia suas capacidades e habilidades. Esforços para aprender e reaprender tornam-se, cada vez mais, uma corrida sem fim.
As marcas devem se adaptar e se preparar diante desse turbilhão de dados, caso contrário, oportunidades importantes se perderão em relação ao comportamento do consumidor e, portanto, de suas percepções. Para muitos, é uma grande oportunidade que vai acelerar ainda mais nosso aprendizado e aumentar as necessidades demandadas pelo mercado de trabalho.
Como Kevin Kelly aponta em seu livro “O Inevitável“, uma das grandes tendências que guiará os próximos anos tem a ver com deixar “fluir”: deixar-nos levar por uma corrente cada vez mais rápida, na qual nossas próprias capacidades terão que adaptar-se para aprender e esquecer a uma velocidade que só crescerá.
Sustentabilidade open source
Os consumidores estão cada vez mais inclinados a preferir aquelas marcas capazes de ir além de suas plataformas de sustentabilidade. As marcas estão transcendendo seus próprios limites, buscando agregar valor e compartilhar livremente seus conhecimentos e tecnologias, a fim de oferecer soluções efetivas para muitos problemas do mundo atual.
Vários estudos e casos de sucesso apresentados em 2018 mostraram como o consumidor médio tende a prestar mais atenção naquelas empresas que obtêm um retorno verdadeiro de suas iniciativas em aspectos mais gerais da vida humana.
É verdade que o consumidor, no momento da verdade, diante de uma marca, valoriza aspectos como preço ou oferta. No entanto, a verdadeira notoriedade de uma marca é alcançada a partir da geração de experiências emocionais que contribuem para a fidelização e decisão de compra das pessoas.
“A criação de plataformas de contribuição que impactam o futuro desenvolvimento da sociedade em que estamos inseridos, de acordo com suas necessidades e expectativas, é substancial para reforçar o nosso papel como um ator que está liderando o crescimento sustentável de nossas comunidades.”
Martha Arbelaez, Diretora de Marketing e Comunicacões da Nestlé Colõmbia
Marcas change makers
As marcas cidadãs caracterizam-se por terem um propósito claro para melhorar o mundo de uma maneira relevante para seus negócios e por estarem comprometidas com crenças e ideologias. Muitas dessas empresas possuem políticas operacionais internas ativas e ações de responsabilidade social e sustentabilidade com as quais contribuem para esses fins.
No estudo “Do eu a nós: o surgimento de marcas com propósito”, elaborado em dezembro de 2018 com a participação de mais de 30 mil consumidores, 62% dos entrevistados dizem querer que as empresas sejam significativas em questões sociais, culturais, políticas e ligadas ao meio ambiente. Não parece um bom momento para manter-se neutro. E, no atual mundo da hipertransparência, tampouco parece valer a pena esconder-se atrás de um perfil discreto.
O que as empresas devem fazer para não perder competitividade diante deste novo cenário? Colocar em palavras quem são, qual é sua alma, o que fazem e por que estão aqui, em um sentido que transcenda a mera atividade empresarial: descrever seu propósito no mundo.
Autores
Juan José Tirado
Alejandro Martinez
Fernando García
Hugo Valdez Padilla
Marlene Gaspar
Guillermo Tejada
Alejandra Aljure
Bárbara Ruíz